Escrever é pensar em pedacinhos e tentar descobrir a forma de
trançar estes pequenos pedaços coloridos em um fio longo, tramado, contínuo. É
arte de tempo e de vida. Muitas são as tecelãs nas diferentes mitologias.
Dentre elas, as primordiais moiras (ou parcas, para os romanos) são senhoras do
tempo: a primeira fia, a segunda escolhe e estica o fio, a terceira o corta.
Senhoras de nossos tempos.
Penélope é outra tecelã. Ao contrário das moiras, tece durante
o dia a mortalha de seu amado Ulisses, trazendo-o de volta à vida de noite, ao
destecer tudo o que havia feito. Penélope tenta ser senhora de seu tempo, do
tempo de Ulisses, eternizando a vida que passa entre o tecer e o destecer: tempo
em estado presente, em estado de memória.
O que foi tecido é presente.
Tenho tentado tecer palavras todos os dias. Em
pedacinhos. Procuro juntar coloridas pontas de um tempo que escorre aos poucos.
Teço os momentos que chegam em fios primários: azuis, vermelhos e amarelos. Às
vezes, teço frases que saem tortas, não parecem “tapetes”, “cobertores”, mas “jacarés”.
Outras vezes, penso em bonecos de neve na quase Páscoa em que estamos.
Hoje também tento tecer. Teço os momentos que se vão para trazê-los
até o agora: o que foi tecido é presente. Teço os possíveis futuros, as
possíveis linhas que nos chegam. Teço em pedacinhos coloridos, recolhendo os
pequenos fios que coleto, emendando-os em pontos de trança. Os novelos de tempo
unem os diferentes fios de vida. Sigo com meus cabelos em lã cinza, quase
branca, tramados em ponto de trança.
Penso no tecer em pedacinhos justo hoje: dia em que a
Tecelina completa maioridade. Há 18 anos, num sábado, durante a festa que
inaugurou a temporada de celebração de dez anos da Editora Projeto, nascia
Tecelina. Desde então, nossa menina (da Cristina Biazetto e minha) tem seguido seus
dias pacientemente, criando laços e tramando vidas leitoras. Autônoma. Tantas
vezes, eu me surpreendo e a encontro em lugares que nem esperaria encontrar, entre
leitores que a conhecem e a levam para passear por seus próprios caminhos tecidos.
Penso no tecer em pedacinhos hoje, quando a Tecelina chega à
maioridade, pois com ela, e com tantas outras tecelinas que povoam minha origem
e meus dias, tento aprender a arte de tecer o tempo através de fios coloridos. Com
ela tento ter a paciência de tecer pouco a pouco, para transformar o tempo em
um tecido de ideias e de afetos.
Obrigada por nos ter dado a Tecelina, ela certamente nos ensinou a pensar nas tecituras da vida e particularmente me ajudou a brincar com meu neto. Amo tecelina.
ResponderExcluirEu que agradeço, querida Ju, por poder estar, de certa forma, junto com você e seu neto, brincando! Um beijo para você e outro para ele!
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