quinta-feira, 16 de abril de 2020

QUASE DOMINGOS


Há algo de preparação na dinâmica dos dias: acordar, tomar café, lavar a louça, aguar as plantas, alimentar os animais, tomar sol. O sol geladinho das manhãs de outono traz a memória primitiva humana dos tempos em que, bebês, nos colocavam para tomar sol. Braços e pernas nus ou cobertos, conforme a época do ano, cedo pela manhã, os bebês são expostos ao sol pelas mãos de um adulto.

Esta pode ser a sensação de muitos quando os dias são quase todos domingo. Cedo, o pouco movimento das ruas envolve o sol em seus silêncios. Sentados ao sol, no silêncio das manhãs, somos bebês sem palavras. Nada distrai nosso corpo, esponjas de claridade. Os raios de sol no outono, perto das 7 da manhã, não são os que bronzeiam, nem os que laceram a pele. São esperança de aquecer a alma, junto com tudo o que se desperta: pássaros, sons de canecas, um ou outro carro, cachorros ao longe, silêncios de gatos...

Cedo, no outono, pode-se ouvir o mundo pela janela, como as crianças em seus tempos de peitoril, olhando a vida que passa. Somos meninos de janela, tentando descobrir a hora certa de sair para brincar. Ou planejando em que recanto nos escondermos, nas futuras brincadeiras de esconde-esconde. 

Hoje e todos os dias são quase fins de semana. Perto das 7 da manhã, quando o sol ainda não arde e ainda não está bem claro, acolhemos em nossos corpos a manhã que desperta. E guardamos para mais um dia o olhar da criança que tem na rua um grande quadro vivo por onde seus olhos e seus ouvidos passeiam.

De domingo a domingo.

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