Tenho acompanhado diferentes postagens sobre o momento que
estamos vivendo. Dentre elas, as que falam de criações artísticas e das
alterações urbanas ou naturais que vêm ocorrendo em função da redução de
circulação humana no mundo. Há muita criações artísticas neste período de
pandemia, várias delas tentando registrar o momento histórico por que passamos,
buscando refletir sobre ele, ou simplesmente se preocupando em atravessar este
momento de uma forma emocionalmente mais saudável.
Uma destas iniciativas artísticas é a série de fotografias
intitulada Insulae, do fotógrafo Raphael Alves, que vem registrando em
imagens o cotidiano de Manaus, capital do Estado do Amazonas. Em isolamento
social, saindo apenas para o necessário, Raphael carrega sempre sua câmera, de
modo a registrar as diferentes “ilhas” em que estamos vivendo. Trata-se de um
impactante registro de foto-jornalismo. Insulae, nome latino que
originou no Português a palavra “ilha”, é uma metáfora da situação de
isolamento em que nos encontramos.
Com sua câmera e seu olhar, talvez Raphael busque a melhor
forma de registro e de reflexão sobre pessoas de máscara, janelas ocupadas,
filas em lotéricas para pagamento de contas, sacolas indo e vindo de
supermercados, poucos carros nas ruas, ônibus vazios, casas de idosos e escolas fechadas...
Penso na metáfora “ilha”, no conjunto de ilhas, também: “arquipélago”.
Somos arquipélagos hoje. Isolados, estamos rodeadas de outras
ilhas. Algo quase inédito para nós, seres humanos, acostumados a viver em
estado de oceano. Éramos humanos que pensávamos ser oceanos, parte principal e
responsável pela existência da Terra. Em estado de oceano, circulávamos livremente
pelo mundo, senhores de nossas ações, imprescindíveis, absolutos. Livres,
levando por nossas águas não só nossos valores (descobertas científicas, manifestações
artísticas, gestos de solidariedade), mas também nosso lixo, que
segue indo e vindo, flutuando sem rumo por nossas correntes marítimas.
Hoje, não mais oceanos, nosso estado insular nos mostra que
não somos senhores de nada, mas parte de um mundo diverso. Somos ilhas que nada
circulam, apenas recebem em suas praias o ir e vir do oceano. A natureza, sim,
em seu estado oceânico, nos mostra que não é a Terra que está doente, mas nós
que a fazemos assim. Pequenas pontas de terra despertada, somos hoje o que
sempre deveríamos ter sido: parte da Terra, que nos dá sinais de que é muito
maior do que nós. Generosamente, em correntes fluidas, a natureza nos mostra
que não somos a Terra, mas apenas parte dela.
Penso isso hoje, nesta segunda-feira, quando, pequena ilha em
minha casa, leio que, depois de quase oitenta anos, os picos do Himalaia podem novamente ser vistos.
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