Passadas estas duas semanas, retorno à minha agenda. Ainda
costumo usar agendas de papel, pois posso anotar os compromissos, riscá-los,
substituí-los, relembrá-los, guardá-los em manuscritos. Desde que estamos em isolamento social, todos os
compromissos que acontecem fora de casa foram cancelados. Pelo menos os de março
e os de abril. Por enquanto. A maioria das minhas anotações de agenda são as de
compromissos fora de casa. Não precisamos anotar coisas do tipo “acordar a tal
hora”, “organizar a casa”, “fazer a comida”, “escrever” ou “tomar banho”, por
exemplo.
Começo a folhear minha agenda e releio tudo o que quase foi. Num
primeiro momento, tive a sensação de morte, como se eu folheasse a agenda de
alguém que morreu e pensasse: “Vê, coitada, se estivesse viva faria tal e tal
coisa”. Mas a agenda era minha e não estou morta. Ainda não, quem sabe um dia,
daqui a muitos e muitos anos, espero!
Começo, assim, a sentir a sensação de um futuro que não foi.
De um futuro que não mais será. Futuro do pretérito. Entendo agora na prática o
que muitas vezes tentei explicar para os meus alunos: o futuro do pretérito, o
que seria e não foi, o futuro do quase. Há um certo desespero em saber que
quase tudo o que projetamos será por um bom tempo futuro do pretérito. Assusta.
Deprime? Não... Não vamos chegar a tanto!
Em minha cabeça, que tantos anos estudou gramática para tentar
fazê-la menos distante daqueles que se assustavam com ela, começo a buscar um
antídoto para curar esta sensação de um quase futuro, aquele que existiu apenas
nos nossos planos. Encontro então, nos presentes, este jeito de não sentir que tudo
poderia ter sido e não foi.
Abro minha agenda a cada dia. Registro o agora. Refaço dia a
dia cada página! Que ela seja um presente diário, feito de tudo o que as manhãs possam nos proporcionar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário